terça-feira, 30 de setembro de 2008

SENAR-CERÂMICA - Piaçaguera-Paranaguá-PR





Fui a Piaçaguera, na Baía de Paranaguá, ministrar o curso de Cerâmica Básica do Senar-PR. Lugar de grande beleza cênica, de frente prá parte leste da Baía de Paranaguá, com vegetação de mata Atlantica ainda densa e praticamente intocada. As árvores sãolotadas de bromélias, em alguns lugares o chão também. Muitas orquídeas e aquela abundância de vegetação densa com uma variedade que faz a mata Atlântica ser conhecida como a floresta de maior diobiversidade do planeta. Não esqueçamos que estamos na maior faixa contínua remanescente da Mata Atlântica. Só que é uma merreca, se comparada ao que foi devastado(sobraram 6%). Todavia esse pinguinho de mato ainda aí está, resistindo ao ataque desenfreado da nossa onívora civilização, por enquanto.
Nos primeiros quatro dias de curso em Piaçaguera pude perceber a necessidade que tem o nosso belo povo caiçara de substituir o seu modo de sobrevivência. Antigamente a pesca supria as necessidades. Mas, agora, dentro da baía, em frente ao porto de Paranaguá, os peixes minguaram, os plásticos nadam em cardumes e os biguás voam de lá prá cá, tentando desesperadamente identificar qualquer movimento de peixes. O artesanato local com cipós é muito bom. A cerâmica artesanal,por ser uma atividade que não agride o meio ambiente, é uma grande forma de sobrevivência que deve ser incentivada.
Voltei para completar o curso com ânimo total, tentando ensinar e aprender com este povo, oprimido e não recompensado pelo que está perdendo de cultura e dinheiro com esvaziamento das suas fontes de sobrevivência e pela opressão que também sofre pelos meios de comunicação. Uma enxurrada de produtos de péssima qualidade (tem em qualquer supermercado de qualquer cidade = conservantes, aromatizantes, corantes, flavorizantes, margarinas, açúcar, enlatados, embutidos, etc, etc.) para substituir a saudável comida retirada antigamente do mar, só vem completar o quadro.
São 8 dias de curso. É muito pouco! Estou tentando ampliar o curso, com acompanhamento, para que a inciativa que é muito bem recebida seja incentivada e aperfeiçoada. A cerâmica não se aprende rapidamente, salvo raras excessões. Precisa de muito treino e acompanhamento, até que seja aperfeiçoada. Construí o forno cerâmico artesanal, cuja queima saiu perfeita, como pode ser observado pela foto.
Para procurar argila com a finalidade de compor massa cerâmica, fomos pela praia. Na volta, por trilha no mato. Para quem mora em Curitiba, sem mar, é fantástico caminhar numa praia com vista ampla, panorâmica.
A Baía de Paranaguá tem tradição cerâmica. A Ceramista Senhorinha, da Ilha de Medeiros, deixou escola, muito embora quase só na lembrança. Consegui um vídeo com depoimento da Sinhorinha que deixei para os moradores de Piaçaguera. Este trabalho da Sinhorinha era uma tradição aprendida de seus antepassados indígenas. Usava queima direta colocando as peças no meio dos galhos secos de lenhas. A queima não durava mais que uma hora. Sinhorinha tinha grande habilidade, modelava todos os tipos de utilitários (vasos, panelas, jarros, etc), a maioria desenvolvidas por ela mesma, sozinha. Era ajudada pelo marido nas tarefas mais pesadas, como ir buscar o barro e fazer o fogo. Interessante que usava a velha proporção básica, 70% de matéria-prima plástica e 30% de anti-plástica, para compor a massa resistente à essa queima direta. Existe ainda muitas peças dela espalhadas pela baía, mas não restaram ceramistas. Acredito que assim que começarem a surgir centros de produção nas ilhas, este artesanato ressurgirá com força total.

sábado, 20 de setembro de 2008

VIVÊNCIA-FERACOMCIÊNCIA- R A K U


Mês de setembro e agora de outubro está sendo de muita correria. Ministrei várias oficinas de Raku. Primeiro a Vivência aqui no meu ateliê. Fantástica, com 11 participantes. Criou um clima muito bom, as pessoas mostraram grande interesse e o resultado apareceu, apesar de ser apenas um dia. Mas, sendo uma Vivência, o bom é o dia agradável, tranquilo, com boa onda e comida deliciosa. Assim foi. Ao saírem da Vivência as pessoas combinaram encontrar-se noutro dia para leros leros, tangos e boleros. Com essa mesma turma acabei indo assistir a um show de música italiana com um gancho na música brasileira, promovido pelo Consulado da Italia, chamado "A Vida é a Arte do Encontro". Foi organizado pela italiana Elvira, do Consulado, uma participante da Oficina. O título é sugestivo para continuação da Vivência.
Participei do Projeto Paraná em Ação, em Curitiba, ministrando 2 oficinas de Raku por dia, durante 6 dias. 12 queimas. Era para os alunos das escolas públicas Curitibanas e o povo que estava visitando o local e aproveitava para conhecer a queima de Raku e já participava passando um vidrado numa peça que estava à disposição, previamente biscoitada. Até os garis que faziam a limpeza da praça aproveitaram o momento e fizeram uma peça cada um que depois levaram para suas casas. Enquanto a queima estava acontecendo eles voltaram ao trabalho, retornando para a abertura do forno e limpeza das cerâmicas, resfriadas no ato, como acontece nesse tipo de queima. Foi interessante, o povo, alunos, as pessoas que participavam do próprio projeto, em frente ao Palacio do Governo, vieram conhecer a técnica e levar o resultado embora. O Raku realmente é uma forma alegre de trabalho cerâmico, muito rápido, eficiente e mesmo para pessoas que nunca tiveram experiência anterior de cerâmica o resultado é sempre positivo.

Participei, também, do Projeto Fera Comciência, da Secretaria Estadual de Educação, em Curitiba. O tema deste ano é a comemoração dos 100 anos a imigração japonesa. Aí é que o Raku se encaixa, como também nas oficinas anteriores. Técnica cerâmica de origem coreana e desenvolvida no Japão onde é usada desde o século XVI. O Projeto Fera Comciência é fantástico que não pode perder sua energia, pela grande quantidade de informações que os alunos da rede pública recebem e que são inesquecíveis para eles, pois nossa população que não tem condições de frequentar as escolas particulares também não tem condiçòes de frequentar nada. Só o fato de participarem de um evento artístico-científico já é inesquecível. A oficina era a mesma do Paraná em Ação, somente que para professores da rede pública. Foi muito interessante porque participaram professores de química, biologia e artes. A técnica de Raku é muito ilustrativa no caso da química, onde presenciamos visualmente um caso clássico de reação química de óxido-redução. Costumo ilustrar essa reação química com o pigmento óxido de cobre que é um verde usado nos vidrados. Quando se observa um fio de luz de cobre, que é vermelho, oxidado, aparece uma película esverdeada, é o óxido de cobre. Nos tachos de cobre também a oxidação deixa uma mancha verde que popularmente é conhecida como zinabre. Não confundir com cinábrio que é o mineral sulfeto de mercúrio. Bem, quando o óxido de cobre é misturado num vidrado transparente o resultado, após a queima, é a cor verde ou turqueza, dependendo da qualidade do vidrado (base plúmbica ou alcalina). Como a técnica de Raku usada no ocidente é um pouco diferente, criada pelo americano Paul Soldner, temos um sincretismo cerâmico nipo/ocidental. Lá a peça cerâmica quando,dentro do forno, atinge a temperatura de 1000 graus centígrados, é sacada para fora do forno e imersa nágua, para resfriamento imediato. Paul Soldner resolveu colocar primeiro na serragem, onde acontece uma redução forçada.Aí ocorre a redução química. A serragem, matéria orgânica, devido à alta temperatura, queima imediatamente, todavia, para a sua combustão necessita de oxigênio. Como no meio da serragem tem pouco oxigênio e a tampa do recipiente costuma-se fechar para melhor redução e ainda evitar a fumaça da queima, a serragem retira o oxigênio do óxido de cobre, transformando-o em cobre metálico de cor vermelha. O vidrado que seria verde torna-se vermelho. Exemplo claro, fácil de compreender. Possivelmente algum professor utilizará este processo para ilustrar sua aula, principalmente porque a química é encarada como uma matéria muito chata de difícil compreensão. Para os professores de arte o resultado final da queima é bonito e admirado.
Os vidrados Sangue de Boi, Celadon e Temoku, clássicos vidrados japoneses, também são obtidos com redução, só que a redução ocorre dentro do próprio forno e em alta temperatura, acima de 1250 graus centígrados.
Foram dias corridos, mas gratificantes...